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Minha música preferida do momento. Pra variar: Tom Waits.
Do disco Rain Dogs, de 1985, como tinha que ser!! (Que baita disco!)
Pra mim é uma canção de funeral, um funeral de New Orleans, com a banda militar entrando em catarse jazzística aos 1:57. A voz é extremamente simples, mas ninguém, NINGUÉM, consegue imitar. A carga dramática da voz desse cara é algo!! Parece um cachoro latindo! essa música tem que ser gritada! e só o Tom Waits pra fazer isso direito!

Maquiagem

Ela cheirava a flores mortas. Era o excesso de maquiagem que a tornava vulgar para alguns e especial para mim. Especial porque era tão humana, tão clara. Seus medos e suas ilusões eram tão legíveis que era translúcida. As noites com ela tinham uma espiritualidade carnal tão forte. Eram carregadas de uma luxúria mundana tão sincera, transbordava de nós dois. Eramos parecidos assim, usando um ao outro para nos saciarmos, uma fome que nunca passava.

Gostava do jeito que fumava, de como soprava ruidosamente a fumaça no ar, o filtro do cigarro manchado de batom vermelho. Gostava de seus olhares. Olhava para mim como se me dissecasse, me classificando em seus pobres modelos. A verdade é que não entendia muita coisa. Mas eu também não. Então olhávamos um para o outro do mesmo jeito, um se achando mais esperto que o outro, ambos olhares dizendo: “não caio nesse teu jogo”.

Essa era a graça da coisa. Uma piada com uma blue note. Durou pouco, mas marcou forte. Da única maneira que poderia ser.

Faz tempo que não escrevo, perdi o hábito. As teclas, que costumavam ser macias, estão duras, o toque não é mais suave. Estou aqui sentado, em mais um quarto quente, de outra casa. O silêncio noturno é o mesmo, a insônia também, o jazz também. Só eu que não sou.

Não saberia dizer exatamente quando aconteceu, mas mudei (de novo). Não tenho mais as mesmas expectativas. Mas acho que o que realmente mudou foi a ficção. Parece que histórias ganharam um novo significado para mim. Hoje sei que me alimento delas, são artigos de fé. Entendo que boa parte do que esperamos da vida é culpa das histórias que ouvimos, dos mundos que criamos.

(Outra coisa que permanece é a aleatoriedade) Fujiyama! Que bela música. Quase enxergo uma cerejeira florida, uma colina de pessegueiros, flores coloridas flutuando no ar outonal. Sim, jazz é uma linguagem, como bons filmes, boa arte. O que define se algo é bom é a qualidade da experiência que proporciona. Proponho um sistema de classificação: quantos dos outros sentidos e com que intensidade são mobilizados por uma experiência artística. Você já sentiu o cheiro da cena de um filme? Enxergou a paisagem de uma música? Escutou a melodia de uma pintura? Cinestesia meu chapa! Nem precisa de ácido!

Deixo que a música me transporte noite afora. Afora junto, de aforismo, aforismos noturnos. Rá! Bares e mesas distantes, não me faz falta hoje uma cerveja gelada, nem o calor gelado de uma companhia feminina (talvez o perfume faça). Não quero hoje nenhuma dessas formas de embriaguez. Quero a doce lucidez da fantasia, as promessas mornas de mundos que não conheço porque só existem dentro de mim.

A praia…

Eu não esperava! Na verdade até esperava alguma coisa nova, mas não algo assim. Não esperava que o cheiro dela fosse de praia, o cheiro e o gosto…

É impossivel encontrar palavras para explicar o que o cheiro de praia significa pra mim. Nem mesmo posso definir como é especificamente esse cheiro (não! não parece bloqueador solar!!). Mas posso dizer que é um daqueles cheiros (cheiro de praia, de grama molhada e de gasolina, nessa ordem) que quando surgem, mudam instantaneamente o meu estado de espirito. Me transportam, ou para momentos que vivi com intensidade, ou para ambientes que me fascinam e “praia” sempre foi um desses.

Então, encontrar alguém com esse cheiro, foi uma descorberta. Totalmente inesperado, e por isso, fantástico, e por isso perfeito.

E foi tudo tão intenso e leve, e isso pareceu tão normal, como se intenso e leve fossem a mesma coisa. Como se fosse sempre assim. Isso foi o que mais me surpreendeu, pq não, não é sempre assim.

Isso agora está associado ao cheiro de praia, definitivamente. E, a partir desse momento, a rua da praia pra mim é uma travessa cubana da Cidade Baixa…

If. Then. Else…

E aqui estamos mais uma vez rasgando a noite, sem pudores, sem valores. Qual a finalidade disso? Qual o resultado disso? Quando isso acaba?

Não temos resposta, nem para essas, nem para nenhuma outra pergunta. Só temos impulsos. Contrários a qualquer recomendação de bom senso, simplesmente seguimos noite adentro, por becos escuros e cantos inabitáveis, intransitáveis. Preferimos esses lugares, são mais acolhedores.

Sabemos qual vida deveríamos ter e por quais ruas deveríamos andar, mas há algo que nos impele, algo que nos conduz ao medonho, ao obsceno, ao imoral.

De alguma forma irracional também sabemos que isso é natural e incontrolável. Que executamos um papel importante. Tão importante quanto as profissões mais respeitáveis: somos tão necessários quanto médicos e padres.

Executamos um algoritmo de contenção da espécie, de autodestruição, tão importante quanto o da sobrevivência. Somos os mais capazes, os únicos que podem fazê-lo.

Somos a escória, assassinos, ladrões, advogados. Somos pivetes drogados, entorpecidos pelo crack, prostitutas transmitindo doenças venéreas, bêbados que batem nas esposas, psicopatas, esquizofrênicos, suicidas. Somos ditadores do oriente médio e skinheads, arruaceiros agitadores e senadores corruptos. Somos aqueles que afundam, em declínio direto, em queda livre. E levamos o que podemos, convertemos mais que as religiões.

Temos trabalhado muito, muito mesmo para consertar os erros da espécie, para conter o desastre eminente. Somos acionados em momentos críticos, quando a humanidade sai da linha.

Se a espécie sobreviver a sí mesma, seremos os salvadores…

E não receberemos nenhum crédito por isso.

Não esperar

É a velha letargia que atinge os ossos novamente. É uma espécie de desespero, na acepção do termo, desesperar = perder a esperança. Reações histéricas não são verdadeiramente desesperadas, nelas, de alguma forma, se espera que os gritos sejam ouvidos.

Desespero é não gritar mais por entender que não adianta. É se entregar ao vício da apatia, ao conforto da conformidade. É encontrar uma porta fechada e não querer abrir, não se importar com o que há do outro lado. É dar crédito ao fato racional e cruel de que nunca se chega ao horizonte. Isso é desespero real e é disso que eu tenho mais medo!

Marte em sagitário

O que eu vejo de especial em mulheres que tem comportamento sexual promíscuo, que parecem buscar apenas sexo lascivo, sem qualquer apego emocional?

Qualquer um responderia: “Ora cara, tu procura por sexo lascivo, sem apego emocional!”.

Mas não, não é assim que funciona! É por essas que eu me apaixono! São as que me derrubam! As carinhosas, as legais, as que esperam que eu ligue depois e mande mensagens, com essas eu sempre fui frio e até cruel algumas vezes!

Já imaginei uma porrada de motivos para isso. Devo ter encaixado isso em todas as teorias da psicologia, psiquiatria, filosofia, religião e até matemática. Mas nunca achei uma resposta que me satisfizesse.

Talvez eu as veja como mais fortes do que eu. E queira elas porque sou covarde demais para ser a parte forte da relação. Ou porque eu queira ser igual a elas. Ou por que elas assim se pareceriam o suficiente com a minha mãe, e daí eu me sentiria mais seguro, apesar do paradoxo de sentir insegurança perto delas. Ou ainda auto punição por alguma culpa recalcada, por querer afogar minha mãe com meu mijo na mais tenra infância, ou querer matar a minha irmã por ciúme?

Só aí já vão váááárias escolas de psicologia e psicanálise.

Bom, talvez seja o tal sensation seeking pegando, afinal, quer estado de alerta maior que a incerteza que elas provocam?

Bom, tanto faz a origem do problema, psíquica ou neuro-bio-química, construção social ou vontade divina, não importa. O que me intriga é: Porque? Buceta! Porque eu tenho que curtir me colocar em situações e agir da forma que eu mais odeio que ajam comigo??? E pior, não é só comigo, parece ser fenômeno geral!!!

O foda é que, pelo menos na minha não tão vasta experiência, o sexo com elas é sempre muito bom. São libertas de tabus e de pudores excessivos. admitem sua sexualidade de forma bastante natural, até mesmo algum desvio ou outro. Admitem gostar de pau!! Via de regra.

Seguem seu próprio prazer e o ritmo natural e não ficam se preocupando se estão agradando ou não. Claro que estou generalizando, claro que estas características podem não estarem associadas a este fenômeno e ser apenas minha falha de interpretação, por não ter uma amostra estatisticamente válida (olha a matemática aí).

Mas por enquanto é o que eu pude perceber. E por enquanto, isso vem ampliando o que eu sinto em relação aos contratos convencionais de posse e exclusividade em relacionamentos: Não são naturais. São baseados em insegurança e medo. São garantias contra o terror da solidão, de acabar assumindo sozinho seu próprio destino.

O que chamamos de amor, e o que celebramos em casamentos, é a negação da liberdade individual e da responsabilidade total sobre as escolhas individuais.

Por isso o fascínio e o medo que mulheres libertas nos causam. Por isso que elas foram (e ainda são) perseguidas e mal vistas, taxadas de vagabundas. Por isso os respeitáveis pais de família escolhiam esposas submissas e se divertiam com as mulheres livres nos bordéis e por isso o sexo se tornou algo vergonhoso e perverso.

E por isso somos todos neuróticos…

Amor

Um dia o mundo acabará, e estaremos lá nós dois. Não sei com quem tu estará, não sei se ainda lembrará de mim, mas eu pensarei em ti.

Não sei como será, talvez eu veja um clarão e uma nuvem de poeira e tudo então seja tragado pelo caos.  No momento em que eu entender o que está acontecendo, quando eu perceber a inevitabilidade de tudo, pensarei em ti.

Pensarei em ti como nunca pensei. Não da forma como pensava antes, não da forma como penso agora. Será algo novo e tu será nova pra mim…

Caminhos

…então levantou e seguiu andando. Andar era o que lhe restava. Desfez-se de tudo, como se cada perda fosse uma vitória pessoal contra tudo que lhe mantinha preso, contra a ilusão de que a vida é necessariamente o que as cidades oferecem, a ilusão de que a vida é necessariamente alguma coisa. Levantou e seguiu andando, a nova vida começava ali, naquele banco que deixava para trás, seu marco zero. Não se dobraria mais, não sofreria mais. Descobriu que o sofrimento estava associado ao apego. Apego pelo material, pelo emocional, apego por si próprio. Descobriu que as coisas (incluindo as pessoas) não duravam, que tudo era inconstante, impermanente. Percebeu que, se tudo é finito, tudo tem o mesmo valor. Percebeu que o sofrimento deriva do apego pelas coisas impermanentes. Decidiu então se esvaziar, viver fora da lei do desejo.

*****

…então levantou e seguiu andando, era o que lhe restava. Deixou para trás uma vida inteira de conquistas duvidosas, livrou-se das coisas e dos hábitos que lhe prendiam, da noção de que a vida é o que a sociedade oferece, de que ela tem que ser alguma coisa. Decidiu não se dobrar, revoltou-se contra o sofrimento. Descobriu que o sofrimento estava ligado a repressão das emocões, desejos e experiências. Descobriu que as normas de conduta social tinham por principio reprimir desejos e emoções e condenar experiências. Descobriu que as coisas (incluindo a vida) não duravam e que por isso deveria aproveitá-las enquanto existiam. Descobriu que quando reprimia emoções e desejos, deixava que as coisas se extinguissem sem que tivessem sido aproveitadas. Decidiu então se preencher, viver fora da lei da repressão.

Último dia de trabalho

Não havia nada que pudesse ser feito, as coisas continuariam sua trajetória rumo ao caos. De posse dessa informação, ele se recostou na cadeira e pôs os pés sobre a mesa, respingando sangue no mármore branco, sentindo orgulho de sua atitude.

Tomara a decisão esta manhã, durante o café, enquanto a televisão transmitia o informe econômico e no jornal as notícias internacionais davam a situação do último conflito no oriente médio. As notícias que recebia dos dois veículos não tinham nada de especial, eram praticamente as mesmas todos os dias e não diziam nada a respeito de sua vida, assim ele via. Só mudavam os lugares e os números, todos os dias.

Ele percebeu que a decisão não havia surgido ali, que ela já era decisão antes, quando a idéia lhe brotou na cabeça. Só estava testando os argumentos até aquele momento e foi como se o papel da imprensa ali fosse o de dissuadí-lo de seus propósitos. Gostava de pensar todos os dias, que encontraria um motivo para não fazer o que fez e que poderia então parar de pensar nisso. Na verdade sua esperança, não, não era esperança, sua convicção era a de que isso não aconteceria. E cada vez que via sua decisão reforçada pela mídia, sentia aquilo como uma pequena vitória.

Saiu de casa na manhã cinzenta, olhou em volta, ninguém na rua. Ele saiu cedo demais para o trabalho, levava consigo a bolsa e um guarda chuva. Não pode evitar o sorriso irônico ao perceber a incoerência de levar um guarda chuva para o trabalho, naquele dia. Riu de seu patético instinto de auto-preservação. De que adiantava agora?

Estava certo de que não fora seu asco natural pela humanidade que o levara aquele caminho. Certificou-se de que seus objetivos fossem realmente nobres, testou cada um dos argumentos, foi impiedoso consigo mesmo ao considerar-se cruamente como completo idiota e totalmente desprovido de importância, apenas para ter certeza de que suas ações não seriam movidas por egoísmo.

Entrou no carro e largou a bolsa e o guarda chuva no banco de trás, começou a passar o cinto de segurança e desistiu do ato, dessa vez sem achar graça da inutilidade daquela precaução. Encarava esses cuidados, não como o hábito automático que desenvolvera nos 55 anos em que viveu, respeitando as leis e os costumes, mas como uma súplica de seu corpo, de sua mente inconsciente para que não executasse seu plano.Ele tinha medo, e isso o deixava irritado e ainda mais obstinado.

Quantas vezes ele já havia imaginado esse fim? Era uma fantasia que o acompanhou desde a infância, quando, em devaneios imaginava a situação e as consequências. Sempre imaginava inúmeros contratempos com os quais tinha que lidar para alcançar o objetivo.

Não escondeu a satisfação de passar reto pelo starbuck, onde todos os dias comprava o café que levava para o trabalho. Era uma vitória sobre o medo. Dirigiu rápido, apesar de ter bastante tempo e logo chegou ao prédio principal, onde ficava o seu escritório. Pegou a bolsa (e deixou o guarda chuva), desceu do carro e andou até a entrada do prédio. Calculou se foi sinal de fraqueza estacionar o carro na mesma vaga de sempre e concluiu que devia fazer tudo o que faz habitualmente, para não levantar suspeitas.

Hoje o sistema de trancas estava sendo reparado, sabia que teria 10 minutos. Passou rápido pelo escritório e pegou a chave que somente ele possuía. Em qualquer situação natural somente essa chave não seria o bastante, o sistema de trancas impediria a entrada de quem quer que seja naquela sala sem uma autorização formal do comitê de avaliação. 75% dos membros deveriam ser reunidos a qualquer hora que isso fosse necessário, o voto seria imediatamente transmitido para o sistema que liberaria a porta. Mas hoje não.

Os 3 guardas estavam parados, a 25 metros da porta o primeiro e a 35 metros os outros 2, com 10 metros entre eles, conforme o protocolo específico, aguardando a reativação do sistema de trancas. O problema de sistemas infalíveis é que a infalibilidade provoca confiança excessiva. O protocolo prescreve que os três guardas deveriam estar empunhando suas armas e em estado de alerta total. e deveriam atirar em qualquer pessoa que ultrapassasse o centro do triângulo em que se posicionavam. As armas deveriam estar apontadas para o candidato que se posicionasse ao centro do triângulo, até que suas credenciais fossem checadas e sua autorização confirmada. As armas sequer estavam preparadas quando ele se posicionou ao centro do triângulo e disparou as duas pistolas contra os guardas mais afastados. Recebeu o tiro disparado pelo terceiro no ombro, pouco antes de derrubar também esse. Mas essa era uma situação que tinha previsto, fazia parte do risco e no final, estava certo sobre os resultados.

Antes de sentir qualquer dor, girou a chave e digitou o código manual de abertura. Entrou e trancou a porta por dentro. Acionou o botão vermelho no centro da sala.

Seu último pensamento, foi a constatação de que esses botões sempre são vermelhos…